domingo, 28 de agosto de 2011

Angoleiro Nagô

Não me surpreende quando ouço que o maculelê é identificado como  dança do Ogum. A minha relação com a capoeira ensinou-me imenso sobre como o racismo institucional e outras ideologias pejorativas se manifestam na sociedade Brasileira.


Eu tive o prazer agradável de conhecer o lendário Mestre João Grande no ano de 1994, em Nova York.

O mesmo disse-me que eu deveria aprender a Capoeira Angola, sendo o meu dever como angolano.


Continuando, afirmou que o seu mestre (Vicente Pastinha 1889-1981) teria aprendido a capoeira aos 9 anos, com um Africano de Angola chamado de Benedito.


Sou discípulo do Mestre a quase 17 anos.
 

A sua fascinante trajetória na capoeira, foi me contada pessoalmente e ainda hoje em dia tem o mesmo encanto:


Nasci em 1933 no interior da Bahia (Itagi entre Ilheus e Itabuna). Aos 10 anos de idade vi um movimento..."corta capim". Fascinado, perguntei o que era e fui dito que era a "Dança do Nagôs" - uma dança dos descendentes Africanos, na cidade de Salvador.

Nao é muito complicado verificar que a mesma pessoa que diz que a capoeira vem de Angola, no mesmo contexto afirma que a mesma manifestação é chamada de dança dos Nagôs.


Quando o mestre chegou em Salvador no inicio dos anos 40, já se teria desenvolvido o tal mito da supremacia Yoruba-Nagô, pelo qual ele e muitos outros são vítimas até hoje.


Mesmo eu como estrangeiro, já reparei que muitos negros brasileiros fazem uso da expressão Nagô simplesmente como uma forma de auto estima e identificação para com as suas ancestralidades.


Nagô=africanos, ou recém chegados do continente em tempos da escravidão.


Mas esta inocência do povo, foi e ainda continua a ser usada por muitos academicos brancos e negros igualmente, como uma maneira de alimentar o mito falso da tal supremacia, convertendo expressões Bantu em expressões culturais de negros trazidos da África Ocidental. ( Professor Totti Angola/ A. Kandimba)


http://kandimbafilms.blogspot.com/
(foto Mestre Pastinha e Jorge Amado)


sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Morte de Aninha – e a “pureza” dos ritos nagôs




Em uma das cartas enviadas a Arthur Ramos, no dia 8 de janeiro de 1938, Edison Carneiro em poucas palavras resume a perda de uma grande amiga e colaboradora: “Morreu, há dias, d. Aninha, do Opô Afonjá, braço do Congresso, sua admiradora”. E dois dias após a morte de Aninha, que chegou a abrigá-lo em seu terreiro durante a intensificação da perseguição política na Bahia, Edison Carneiro publicava em O Estado da Bahia uma ampla matéria noticiando o fato, com o título “Era a mais popular mãe de santo da Bahia” e o subtítulo “O falecimento de Aninha, chefe do maior terreiro do Brasil – Sacerdotisa de Xangô – O centro Cruz Santa do Axé de Opô Afonjá – Um axé inaugurado pelo prefeito Bezerra Lopes – Mais de duas mil pessoas no enterramento da bondosa Aninha”.
Ocupando uma página inteira, o texto vem acompanhado de três fotos, duas delas no topo da página com uma legenda única: “Dois aspectos do sepultamento de Aninha, a mãe de santo de São Gonçalo do Retiro. O ataúde carregado por irmãos de São Benedito é conduzido até o Cemitério da Quinta dos Lázaros. À direita, parte da multidão que formava o cortejo fúnebre”. No meio da página, vê-se “A última fotografia de Aninha, que faleceu aos 68 anos de idade”.
A morte de Aninha, no dia 3 de janeiro de 1938, levaria uma multidão ao cemitério Quinta dos Lázaros, onde a mãe de santo seria sepultada, em cova rasa. Ao introduzir o seu texto, Edison Carneiro não economiza palavras elogiosas ao se referir a “grande perda”, “com o falecimento anteontem da mais popular Mãe de Santo da Bahia – D. Eugênia Ana dos Santos”. Em seguida, informa sobre o fato de ter sido Aninha filha de santo do candomblé do Engenho Velho – o mais antigo do Brasil – na época dirigido pela ialorixá Maximiana Maria da Conceição. E continua:

E apesar de ser o seu próprio “terreiro” mais rico, mais concorrido e mais belo do que o da linha do Rio Vermelho, Aninha sempre reconheceu ao Engenho Velho a supremacia espiritual dos Candomblés da Bahia e, portanto, do Brasil. Ali, na “roça” de São Gonçalo se observava, na sua maior pureza, o culto nagô aos deuses africanos.

Seu objetivo com essas palavras, como é possível observar em momentos anteriores, era valorizar aquilo que considerava mais tradicional, posicionando hierarquicamente acima dos demais, com rituais e costumes mais próximos das raízes africanas.

Universidade Federal da Bahia: Autor / Discente: Vinícius Clay


Na foto: Edison de Souza Carneiro (Salvador, 12 de agosto de 1912Rio de Janeiro, 2 de dezembro de 1972) foi um escritor brasileiro, especializado em temas afro-brasileiros.
Fez todos seus estudos em Salvador, até diplomar-se em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da Bahia, em 1936 (turma de 1935).